COLCHA DE
RETALHOS
Cada vida, a minha e a sua, é uma colcha
de retalhos. Uma colcha comum: retalhos de alegria, tristeza ou esperança, como
é normal na vida de cada um.
O primeiro recorte é o amor dos
primeiros dias - amor-dependência, amor-referência, amor de mãe - ao ser
que fez nascer. Esse amor que apenas percebi já era, em si, suficiente razão
para o meu existir.
Ainda sem compreender direito, já está
posto o segundo retalho: um lar desfeito. Longe do anjo-mãe que cuidava e,
incondicionalmente, amava, esse pedaço do tempo se bordou com as cores da
solidão, do medo de não pertencer, nessa tristeza que foi, então, primeiro
entendimento de viver e de perder.
O terceiro retalho: A puberdade
somou-se ao lar desfeito-refeito e trouxe consigo as primeiras dúvidas e incertezas. O
sexo, força nova surgida, nem de longe conhecida, trouxe o amor imperfeito da hora, objeto e lugar mas, irresistível, na forma de encantar.
Ah! O primeiro beijo no rosto, o
sono difícil de reatar, frente ao retrato, três por quatro, do outro ser que vinha e, na
mente, insistia em ser companhia, na hora de deitar, dormir e sonhar. Esse
retalho foi bordado em sonhos puros, bonitos, porém, inseguros. Como será ser
adulto, ter família, casa, filhos pra sustentar? Um retalho lindo, porém
confuso, sonhos mil na paixão quase infantil do primeiro amor que assalta, que
traz inquietação, esperança e muita insegurança. Estava certo o poeta: Como definir, o que eu só sei sentir?
Vida que segue... uma colcha por
montar, cerzir, costurar e bordar.
O alistamento militar, compulsório, se
fez passaporte obrigatório para o quarto retalho: da vida adulta o primeiro
bordado. Cortinas que abrem em nova realidade e, num segundo, uma visão
que se expande para além do que era mundo: lar e companheiros para brincar. Foi
como subir a montanha para, de lá lançar um novo olhar, percebendo outros
caminhos e pessoas que na luta do viver e caminhar.
Novos retalhos que montar. Muito
colorido em pedaços de tecido: Muita gente, amiga ou indiferente, namoradas de
ficar e namoradas com vontade de noivar. Coisa complicada: sua paquera que
queria com outro namorar. E, ainda, lhe conta com os olhos a brilhar. O que
fazer? Nada! No fim das contas, nada a ver, riso disfarçado desse amor
encantado, impreciso, irreverente, inconstante, disperso, perto, distante...
Vai entender! Sem ter notado, a experiência seguiu ao meu lado, na ciência do
aprendizado.
Não mais que de repente, sutilmente,
surge alguém que lhe rouba o coração. E você, um cara seguro, estanca em
apuro, coração que palpita e, com ele, um ser que se agita, será um pulo no
escuro? Como é casar? Pergunta e ninguém sabe ou quer explicar...
Complicou-se a brincadeira, como é isso? Antes alegria agora compromisso!
E lá se foi o seu coração, bater meio sem jeito, colado em outro peito, entregue com devoção por sua própria mão. Já está bordado e colocado um valioso pedaço dessa colcha de retalhos, que você foi tecendo com sentimento, sem perceber, com a emoção e as cores do viver.
Tantos são os retalhos, impossível
seria enumera-los!
Então o amor se concretiza e a
primavera já é mais linda. Você espia as flores, sente o perfume e se enleva em
suas cores. E, como de poeta e de louco todos nós temos um pouco, você
arrisca o verso:
No jardim dos amores
Nossos beijos são flores.
Nossos filhos frutos.
Deles o licor, néctar do amor.
A vida pinta e borda, parece ser o próprio tecelão, você nem se dá conta que escolheu cada retalho com as cores da emoção.
Você assume o comando ou não, sempre será levado de roldão. A vida não pede
licença, segue acontecendo por estrada ou por atalho e você sempre vai seguindo,
tecendo, enorme colcha de retalho.
Cada filho um retalho, cada neto um
retalho de outro retalho, com as próprias cores e seus amores, sorvetes de
muitas frutas, muitos sabores. No fim, a grande colcha onde muitos se abrigam,
se agasalham, se aninham... se acarinham.
Eu... sigo vivendo, a cada dia um pouco
mais tecendo.
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Um dos textos que mais gosto .
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